Complemento da Ação: Cuida-se do Projeto Substitutivo de Lei Ordinária nº 003/2025, de autoria do Poder Executivo Municipal, que “DISPÕE SOBRE AS ATIVIDADES DOS AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAÚDE (ACS) E DOS AGENTES DE COMBATE ÀS ENDEMIAS (ACE) NO MUNICÍPIO DE ITAPEMIRIM/ES E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS”. Consta nos autos ofício de encaminhamento da proposição com pedido de Urgência Especial, Mensagem ao Projeto de Lei, corpo do projeto de lei e Ofício IPRETIVA nº 100/2025.
Observados os trâmites regimentais, o projeto foi submetido à publicidade e à deliberação na 18ª Sessão Ordinária do presente exercício legislativo, sendo aprovada a urgência especial e, em sequência, encaminhado a esta Procuradoria para manifestação jurídica.
Nos termos do art. 30, inciso I, da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), combinado com o art. 8º, inciso I, da Lei Orgânica do Município de Itapemirim (LOM), compete ao Município legislar sobre assuntos de interesse local. Desta forma, a matéria não conflita com a competência privativa da União Federal (art. 22 da CRFB), bem como não conflita com a competência concorrente entre os Entes Federativos (art. 24 da CRFB).
A iniciativa legislativa no âmbito municipal é regida, entre outros dispositivos, pelo art. 124 da Lei Orgânica do Município de Itapemirim, que expressamente prevê que a apresentação de projetos de lei cabe a qualquer vereador, às comissões permanentes, ao prefeito e aos cidadãos, ressalvadas as hipóteses de iniciativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo, conforme determinação legal específica. O art. 36, inciso II, da Lei Orgânica Municipal estabelece ser de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo a proposição de matérias como a tratada no presente Projeto de Lei, de modo que, considerando a autoria da proposição, verifica-se sua adequação legal.
Quanto ao mérito da proposição, verifica-se que se destina a regulamentação das atividades dos Agentes Comunitários de Saúde – ACS e dos Agentes de Combate às Endemias – ACE, no âmbito do Município de Itapemirim. O Capítulo I e II reverberam, em síntese, mesma redação contida na Lei Federal nº 11.350/2006, havendo, portanto, redação remissiva do art. 2º ao 10. O Capítulo III (art. 11) dispõe que os cargos de ACS e ACE terão o vínculo jurídico regido pelo regime estatutário, com submissão ao Regime Jurídico Único, estando obrigatoriamente vinculados ao Regime Próprio de Previdência Social – RPPS.
O Capítulo IV (arts. 12 a 17) estabelece as normas relativas ao ingresso e provimento dos cargos de Agente Comunitário de Saúde e de Agente de Combate às Endemias, fixando como regra a realização de processo seletivo público, conforme o art. 9º da Lei Federal nº 11.350/2006. De forma excepcional e transitória, prevê-se a realização de processo seletivo temporário, restrito ao período necessário a conclusão do certame principal no prazo máximo de 01 (um) ano. Já o Capítulo V (arts. 18 a 20) disciplina as hipóteses de extinção dos referidos cargos, prevendo ainda que as despesas decorrentes da execução da Lei serão custeadas, prioritariamente, por recursos oriundos do Sistema Único de Saúde (SUS) e, se necessário, suplementadas por verbas do Fundo Municipal de Saúde (FMS) e de outras fontes próprias do Município.
A Emenda Constitucional nº 51, de 14 de fevereiro de 2006, alterou o art. 198 da Constituição Federal, ao prever que os gestores locais do Sistema Único de Saúde poderão admitir agentes comunitários de saúde e agentes de combate às endemias por meio de processo seletivo público, estabelecendo exceção à regra geral do concurso público (art. 37, II, CF/88). Além disso, delegou à lei federal a competência para dispor sobre o regime jurídico e a regulamentação das atividades desses profissionais (§§ 4º e 5º do art. 198 da CF/88).
"Art. 198. ........................................................
§ 4º Os gestores locais do sistema único de saúde poderão admitir agentes comunitários de saúde e agentes de combate às endemias por meio de processo seletivo público, de acordo com a natureza e complexidade de suas atribuições e requisitos específicos para sua atuação.
§ 5º Lei federal disporá sobre o regime jurídico e a regulamentação das atividades de agente comunitário de saúde e agente de combate às endemias.
§ 6º Além das hipóteses previstas no § 1º do art. 41 e no § 4º do art. 169 da Constituição Federal, o servidor que exerça funções equivalentes às de agente comunitário de saúde ou de agente de combate às endemias poderá perder o cargo em caso de descumprimento dos requisitos específicos, fixados em lei, para o seu exercício."
O Supremo Tribunal Federal, ao julgar a ADI 5554, declarou a constitucionalidade dessa excepcionalidade, assentando a tese de que “A EC nº 51/2006, ao prever a admissão de agentes de combate às endemias por processo seletivo público, estabeleceu exceção constitucional à regra do concurso público, cabendo ao legislador ordinário definir o regime jurídico aplicável aos profissionais”. Assim, consolidou-se o entendimento de que é legítima a criação de cargos públicos para ACS e ACE providos por meio de seleção pública, nos termos definidos por legislação infraconstitucional.
Em cumprimento ao §5º do art. 198 da Constituição Federal, foi editada a Lei Federal nº 11.350, de 05 de outubro de 2006, que regulamenta o exercício das atividades dos Agentes Comunitários de Saúde e dos Agentes de Combate às Endemias. O art. 8º dessa norma estabelece como regra geral a submissão desses profissionais ao regime jurídico da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, ressalvando, no entanto, a possibilidade de adoção de regime diverso por parte dos entes federativos, mediante previsão legal própria. Essa ressalva é justamente o fundamento que legitima a adoção do regime estatutário por meio da presente proposição legislativa municipal.
“Art. 8º Os Agentes Comunitários de Saúde e os Agentes de Combate às Endemias admitidos pelos gestores locais do SUS e pela Fundação Nacional de Saúde - FUNASA, na forma do disposto no § 4º do art. 198 da Constituição, submetem-se ao regime jurídico estabelecido pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, salvo se, no caso dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, lei local dispuser de forma diversa.”
O art. 11 do Projeto de Lei estabelece que o vínculo jurídico dos cargos de Agente Comunitário de Saúde e Agente de Combate às Endemias será regido pelo regime estatutário, em conformidade com a Lei Municipal nº 1.076/90 (Regime Jurídico Único), conferindo-lhes natureza de cargos efetivos e sujeição plena ao Estatuto dos Servidores Públicos e demais normas complementares do Município.
O parágrafo único do mesmo artigo determina a vinculação dos servidores ao Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), o que foi analisado e corroborado pelo Instituto de Previdência do Município por meio do Ofício/IPREVITA nº 100/2025, o qual atestou a desnecessidade de elaboração de Estudo de Impacto Atuarial para a matéria neste momento.
O art. 12 do projeto fixa, como regra geral para admissão, a realização de processo seletivo público, nos moldes do art. 9º da Lei Federal nº 11.350/2006, mediante provas ou provas e títulos. Além disso os demais dispositivos, contempla a possibilidade de formação de cadastro de reserva e assegura a aplicação da remuneração mínima nacional prevista no §9º do art. 198 da Constituição Federal.
Neste sentido, o caput e §1º do art. 17 do projeto de lei dispõe sobre a realização excepcional para continuidade dos serviços de saúde pública, do interesse coletivo e do combate de surtos endêmicos, processo seletivo simplificado para contratação temporária pelo prazo improrrogável de até 01 (um) ano, contados a partir da publicação da lei. Havendo ainda a previsão de vedação no §2º do art. 17, dispositivo análogo ao contido no art. 16 da Lei Federal nº 11.350/2006, após o referido período de contratação temporária ou terceirizada de ACS e ACE, ressalvado nas hipóteses de combate a surtos endêmicos, contendo ainda a previsão de que os servidores contratados temporariamente serão vinculados ao regime celetista (vide §3º do art. 17).
A formulação legislativa deve observar rigorosamente os preceitos da Lei Complementar Federal nº 95, de 26 de fevereiro de 1998, que dispõe sobre a elaboração, redação, alteração e consolidação das leis.
Quanto ao quórum necessário para aprovação da matéria, em vista ao que aduz o art. 200 do Regimento Interno, por inexistir previsão expressa em sentido contrário, será adotado no caso em comento a maioria simples como número mínimo de votos para apreciação e aprovação da matéria. Deve-se atentar a imprescindibilidade de análise pela Comissão de Legislação, Justiça e Redação Final (art. 79 do RI) e conforme disposto nos artigos 80 e 82 RI, a manifestação das Comissões de Finanças e Orçamento e de Educação, Saúde e Assistência Social, seguido de deliberação em turno único.
Diante do exposto, conclui-se pela constitucionalidade, legalidade e regularidade formal do Projeto Substitutivo de Lei Ordinária nº 003/2025, no que tange à sua iniciativa, à matéria legislada e ao procedimento legislativo aplicável. Assim, preenchidos os requisitos legais, o projeto encontra-se apto à regular tramitação, devendo ser submetido à apreciação das Comissões Permanentes competentes, seguido de deliberação em turno único, em conformidade com o regime de urgência especial aprovado e as normas regimentais desta Casa Legislativa (art. 151 do RI).
No que tange à verificação da existência de interesse público, a Procuradoria Jurídica não irá se pronunciar, pois caberá tão somente aos vereadores no uso da função legislativa, verificar a viabilidade ou não desta preposição, respeitando-se para tanto as formalidades legais e regimentais.
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